16 dezembro 2017

QUEM SE HABILITA A ENFRENTAR E SOLUCIONAR O PROBLEMA PRISIONAL NO PAÍS? Editorial: Demografia prisional

A população carcerária brasileira cresce continuamente, mas os vexatórios índices da criminalidade não dão sinal de queda.



16/12/2017  02h00

Detentos em celas lotadas no complexo prisional do Curado, em Recife (PE)



Dados recém-divulgados pelo Ministério da Justiça revelam que, em 2015, 699 mil pessoas amontoavam-se em nossos presídios superlotados. O contingente só era inferior naquele ano aos dos Estados Unidos (2,1 milhões) e da China (1,6 milhão). Em junho de 2016, a cifra subiu a 727 mil.

As pesquisas mostram também que, entre as quatro nações com maior quantidade de detentos (incluindo ainda a Rússia), apenas o Brasil contabiliza expansão contínua, ao longo de duas décadas, da taxa de encarceramento. Esta saltou de 95 por 100 mil habitantes, em 1995, para 353/100 mil hoje.

Num país em que os números da violência estão entre os mais elevados do mundo, compreende-se o clamor por punição rigorosa. Entretanto nada indica que a política aqui praticada se mostre eficaz –e tampouco justa.

É assustador, em especial, o acúmulo de presos sem condenação: esse é o caso de 4 em cada 10. No Ceará, a proporção chega aos 66%, a maior entre os Estados.

O resultado é a superlotação inadministrável. A taxa de ocupação média nacional se encontra em 197% –isto é, o número de vagas disponíveis não chega à metade do número de prisioneiros.

No caso mais extremo, o percentual vai a 484% no Amazonas, onde, não por acaso, ocorreu no Ano-Novo o segundo maior massacre de detentos da história nacional.

Cotidianamente se constata que a realidade das penitenciárias implica consequências também fora delas. Basta lembrar que facções criminosas como o famigerado Primeiro Comando da Capital (PCC) foram criadas e são geridas no interior do sistema prisional.

Tais grupos se valem do ambiente caótico atrás das grades para arregimentar novos quadros, em tudo subvertendo os objetivos correcionais do encarceramento. Nesse cenário, o aumento do número de vagas se afigura estratégia dispendiosa e, no mais das vezes, inócua, quando não nociva.

A saída mais racional passa pela revisão do enfoque das políticas de guerra ao tráfico de drogas, que abarrotam as celas sem diminuir o poder do crime organizado.

Há que examinar alternativas como abrandar ou eliminar sanções aos consumidores; mais à frente, a população deve ser consultada sobre a legalização de entorpecentes menos perigosos. O tema, sem dúvida, é controverso; a alta da população carcerária, porém, apenas perpetuará um ciclo vicioso.



Fonte: Folha de SP