01 dezembro 2017

Vídeos que mostram servidores dando choque em presos em cadeias de Goiás foram manipulados, por vingança diz defesa

Ao todo, seis agentes foram afastados de suas funções. Apesar da declaração, MP-GO e OAB classificam atos como 'tortura'.



Por Paula Resende, G1 GO
01/12/2017 17h08  Atualizado há 2 horas


Advogado diz que ações estão dentro do procedimento e que vídeos foram editados
(Foto: TV Anhanguera/ Reprodução)


Os servidores João Cláudio Nunes e Rodrigo Araújo da Cunha, que foram filmados dando choques em presos, prestaram depoimento nesta sexta-feira (1º) na Corregedoria da Secretaria de Segurança Pública e Administração Penitenciária (SSPAP), em Goiânia. Segundo a defesa, eles esclareceram durante cinco horas todos as dúvidas e explicaram que os vídeos foram manipulados (veja abaixo).

      Imagens mostram agentes penitenciários agredindo presos com armas de choque, segundo o MP-GO





         Imagens mostram agentes penitenciários agredindo presos com armas de choque, segundo o MP-GO




“Não houve tortura, eles são inocentes.Todas as imagens foram editadas de forma a dar entender que tinha uma tortura ali, mas era o procedimento operacional padrão do Gope [Grupo de Operações Penitenciárias Especiais]”, disse ao G1 o advogado Rogério Leal.

João Cláudio ocupava o cargo de superintende de segurança do sistema prisional. Já Rogério, o de vice. Eles e mais quatro servidores foram afastados de suas funções após a divulgação das imagens.
Os vídeos foram gravados há anos, mas só vieram à tona na última quarta-feira (29) após a denúncia de um agente ao Ministério Público Estadual (MP-GO). Para o Sindicato dos Servidores do Sistema de Execução Penal do Estado de Goiás (Sinsep-GO), não houve crime.

Uma das situações ocorreu em Jataí, no sudoeste goiano. A gravação mostra que um detento estava deitado em uma rede. Os agentes entraram na cela e, de imediato, um disparou a taser (arma de choque) contra o homem, que caiu no chão.

De acordo com o advogado, neste caso, havia um motim no presídio e os agentes ordenaram que todos os reeducandos fossem para o pátio. Ao fazer a chamada, o Gope notou que faltavam presos, entre eles, o que aparece na gravação. Por isso, foram atrás dele.

“O agente prisional chamou, gritou para o reeducando sair para fazer a busca na cela, mas ele continuou lá com o objetivo de insuflar a cadeia. Só porque o interno não obedeceu, o agente disparou. O vídeo pula a imagem e vai direto como se já chegasse disparando”, justifica Leal.

Imagens mostram agentes penitenciários agredindo presos com armas de choque, segundo o MP-GO



O advogado ressalta que as ações eram filmadas justamente para resguardar o Gope e para, posteriormente, estudá-las. Segundo Leal, outro agente pegou as imagens e as editou com o objetivo de se vingar de João Cláudio e Rodrigo, pois, no último mês, eles conduziram o denunciante para a delegacia por suspeita de facilitação de fuga de um preso.

“O João Cláudio e o Rodrigo são servidores de alta patente, alta competência e não merecem passar por isso. Eles são referência nacional na área”, defende.

Após a alegação da defesa dos servidores, o MP-GO informou que as imagens serão periciadas. Anteriormente, o promotor de Justiça Marcelo Celestino afirmou que as imagens comprovam maus-tratos.

"Não é a forma que deve ser adotada na condução de presos dentro do sistema prisional, ou seja, quando você comete uma injustiça contra o preso, você cria um motivo de rebelião no sistema. Pode contaminar e gerar uma rebelião muito maior dentro do sistema prisional”, alegou.

Tortura

O subprocurador geral jurídico do MP-GO, Sérgio Abinagem Serrano, considera os atos como tortura e cobrará a devida punição dos envolvidos.

“O Ministério Público de Goiás vai estar tomando todas as medidas para punir os agentes que praticaram o crime de tortura, inclusive, buscando a perda do cargo", afirma Serrano.

Para a Ordem dos Advogados do Brasil, seção Goiás, também houve tortura. “Submeter alguém a um sofrimento infundado, como a gente vê nas imagens, afronta a dignidade da pessoa humana, razão pela qual se vê configurado o crime de tortura”, disse o advogado Gilles Gomes, da Comissão de Direitos Humanos.

Vídeos mostram presos sendo agredidos com armas de choque em presídios de Goiás
 (Foto: TV Anhanguera/ Reprodução)


Celestino quer averiguar se o procedimento é praxe em todas as unidades prisionais do estado. Ele chegou a receber uma carta de um detento do Núcleo de Custódia, em Aparecida de Goiânia, Região Metropolitana da capital. No texto, ele afirma que, ao terminar o banho de sol, durante uma revista, os agentes jogaram spray de pimenta nos olhos dos presos.

O MP já questionou o superintendente executivo de Administração Penitenciaria, Newton Castilho, se os agentes do Gope passam por um curso de formação para atuar dentro dos presídios.

No entanto, segundo ofício datado de 10 de outubro deste ano, Castilho informou que apesar do grupo existir há 8 anos, ainda não havia um procedimento padrão e que ele estava em fase de elaboração. Após a divulgação dos vídeos, o superintendente afirmou que o mesmo já está em execução desde a semana passada e que 80 homens do Gope vão passar por treinamento.

Afastamento e mudanças

Na quinta-feira (30), o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), repudiou a ação dos agentes.

“Abusos não são aceitos no governo de Goiás. Quando descobertos, eles são rigorosamente punidos e é o que fizemos e estamos fazendo”, afirmou o governador.

Horas antes, o secretário de Segurança Pública e Administração Penitenciária de Goiás, Ricardo Balestreri, havia informado o afastamento dos servidores envolvidos. Ele classificou as imagens como “absurdas”.

Balestreri afirmou ainda que, atualmente, não há registro dessas práticas no sistema prisional. Mesmo assim, a secretaria vai "triplicar" os cuidados para que isso não ocorra novamente.

"Vamos reforçar o processo de formação dos agentes. Além disso, as armas de choque têm um software que permite identificar quantas vezes ela foi disparada, em que dia, por quem, então vamos aumentar o monitoramento dessas informações, sendo possível questionar se elas estão sendo usadas em excesso ou não.

Além disso, estamos estudando ampliar o sistema de câmeras dos presídios, com a possibilidade de colocar um terminal até na minha sala, para evitar que essas situações ocorram novamente", garantiu Balestreri.




Fonte: G1