23 janeiro 2020

CAOS E PRECONCEITO EM PLENO SÉCULO 21?: Policial penal trans não consegue aposentadoria: "Dúvidas jurídicas"

Jill Alves de Moraes dedicou 33 de seus 56 anos a trabalhar como policial penal em São Paulo. 



Luiza Souto De Universa 
23/01/2020 04h00

Jill Alves mudou seus documentos em julho, e desde então não consegue sua aposentadoria
 Imagem: Arquivo pessoal

Por cumprir o tempo de serviço necessário para pedir sua aposentadoria, deu entrada na papelada há seis meses. Os planos eram já começar 2020 descansando numa casa na praia. O pedido, porém, foi negado por "dúvidas jurídicas": dias após solicitar seu direito, ele alterou os documentos com o nome no gênero com o qual se identifica. Jill é um homem trans.

"O sistema não está preparado pra mim", decreta ele em conversa com Universa.


O atual policial penal iniciou a carreira na Penitenciária Feminina da Capital, no Carandiru, e já passou por 11 unidades ao longo dos anos. Hoje, está no Centro de Detenção Provisória do Butantã, na Região Metropolitana de São Paulo. Ele afirma que sempre foi respeitado pelas presas, mesmo antes de dar início à transição de gênero, em outubro de 2014. Quando quis ser chamado por Jill, ele destaca que foram as detentas as primeiras a respeitarem sua decisão.

Mas Jill passou por constrangimentos, incluindo ameaças veladas de morte, perpetradas, segundo ele, por colegas de trabalho.

"Ao longo da vida, sofri muita homofobia, mas tem uma hora que você lida com isso como lida com a refeição. Ficou tão natural sofrer preconceito que, quando eu não vejo, até me preocupo", diz. "Já fizeram, de dentro do presídio, um perfil falso meu na internet e me chamaram de aberração cromossômica. Abri sindicância, mas minha reclamação nunca foi para frente. Também escreveram 'morte' na parede do posto onde eu fico. Fiz denúncia, mas nada aconteceu."

Além do desrespeito de colegas de trabalho, Jill perdeu o porte de arma assim que começou a sua transição. Na época, a Organização Mundial da Saúde considerava transexualidade uma doença mental ? a chamada "incongruência de gênero" foi retirada dessa lista em 2018.

Viver a tolerância sem o preconceito e o caos, isso nos faz mais humanos


A aposentadoria


Em 7 julho de 2019, Jill deu início ao processo de aposentadoria, ainda com os documentos o identificando pelo gênero feminino. Exatamente duas semanas depois, recebeu sua nova identidade, e prontamente a levou ao departamento pessoal. Mas, em outubro, obteve uma negativa da SPPREV (São Paulo Previdência). A pasta é responsável pela concessão de aposentadoria dos servidores da administração direta do Estado. O motivo: "Dúvida jurídica relevante", conforme consta no e-mail enviado por Jill à redação.

O documento recebido por Jill afirma que: "(...) Visto a dúvida jurídica relevante, impossível assegurar o direito da parte para afastamento (...), cabendo ser indeferido até a manifestação da PGE [Procuradoria Geral do Estado]."

"Em outubro veio essa resposta", diz ele. "Já estava contando com a aposentadoria, procurando uma casa na praia, em Caraguatatuba. Minha família é de lá. Não entendo qual a dúvida do Estado, se desde 2015 já sabiam que estava fazendo a transição. É curioso o Estado fazer propaganda dizendo que acolhe as pessoas trans, me liberar endocrinologista, hormônios, psiquiatra, mas não me dar o direito de me aposentar", desabafa ele, que faz a transição com ajuda de uma equipe multidisciplinar na Unidade Básica de Saúde de Santa Cecília.

Jill segue trabalhando no período noturno, e ainda não tem resposta sobre seu caso. Para Universa, a São Paulo Previdência informou, por e-mail: "A SPPREV solicitou consultoria jurídica à Procuradoria Geral do Estado a respeito do caso, uma vez que os critérios de concessão de aposentadoria são diferentes para ambos os gêneros. O processo está sendo analisado."




Fonte: UOL/UNIVERSA

Contraponto: 

No quesito aposentadoria: 


Por ser ser legalmente do sexo masculino ele agora terá que trabalhar mais tempo, pois as regras são diferentes entre homens e mulheres. Mas a lógica leva a crer que foi esta argumentação. Se é homem 35 anos de contribuição e 60 anos de idade. 

Diferente de ser mulher e ter que ter 30 anos de contribuição e 55 anos de idade, pelas regras atuais, mesmo porque a Reforma do Doria está empacada na Assembléia com dois Mandados de Segurança impedindo sua continuidade, a saída então seria a via Jurídica. Pedido de Aposentadoria com Integralidade e Paridade, sem limite de idade. Não tem outro recurso, ao menos por enquanto.

Pois a partir da aprovação da Reforma ele poderá se beneficiar daquilo que foi aprovado em Brasília e se aposentar com 30 anos de contribuição e com 55 anos de idade, pois é o que consta na PEC enviada a Alesp pelo governador.

No quesito preconceito:


Vivemos tempos de destruição e desrespeito. A sociedade contemporânea vem se autodestruindo e se revelando cada vez mais egoísta. Tamanha decadência humana vem ocorrendo motivada pela falta de cuidado consigo mesmo e a natureza, bem como devido o comodismo e a violência que vem travando uma guerra civil não decretada.

O individualismo vem sendo cultivado e valorizado despudoradamente. Pessoas andam pelas ruas e praças como se fossem únicas, vão aos seus trabalhos e ao chegar não cumprimentam seus colegas e ainda dizem com orgulho que não precisam de ninguém e nunca precisará. Tratam o próximo como se fosse um ser incompleto, sem sentimentos e como propriedades particulares as quais se faz o que quer. Xinga-se, faz-se piadas, ironiza-se, despreza-se. 

Agindo assim pensam serem superiores, senhores, imperadores. Enquanto aquela pessoa que trabalha ao lado, aquele que varre a rua, aquele que atende no supermercado, limpa o banheiro da rodoviária, atende o cliente no hospital ou no banco, aquele que ensina na escola são considerados propriedades particulares, objetos, e são obrigados a escutarem e a fazerem apenas o que é interessante aos que usufruem dos serviços destes.

Outro exemplo do tamanho sentimento que o homem tem de superioridade e que também pode ser retirado da história da humanidade é a representação e a perfeita amostra da perversidade humana, Adolf Hitler. Com a ideia errônea de destruir as chamadas raças “inferiores” e assim salvar o mundo do caos e da depressão. Esse fracassado “empreendeu uma campanha perversa para submeter o mundo. Em 1945, 77 milhões de pessoas (homossexuais, judeus, comunistas, ciganos, esquerdistas, eslavos) foram mortas por ele, que se tornou o responsável pela maior destruição da história.”

A exemplo de tamanho tirano é possível encontrar presentemente pessoas que, a modelo dele, consideram alguns como raças “inferiores” e “indesejáveis”. Para muitos tais progênies não deveriam existir, deveriam ser exterminadas ou pelo menos dominadas.

É possível encontrar também nas falas das crianças a dor sentida por aqueles que são vítimas de preconceito. Como dito anteriormente, as vítimas são aqueles considerados seres “inferiores” simplesmente por pensarem ou serem diferentes. Raquel Pereira de 11 anos disse no livro Histórias de Crianças para Crianças volume IV:

“A discriminação e o preconceito fazem sofrer quem o recebe. Eu sou uma pessoa que sofre discriminação só porque sou peluda, isso me deixa triste e me faz sofrer. Eu não tenho preconceito de ninguém, pois isso é errado. Essa semana a professora contou uma história sobre a dor que o preconceito causa. Na história tinha uma florzinha que nasceu com uma de suas pétalas rachadas, pois um de seus espinhos a rasgou, assim ela ficou diferente das outras flores e todas olhavam para a florzinha e falavam mal dela, da mesma forma acontece comigo. A professora falou que todos nós somos especiais, pois são as nossas diferenças que trazem a alegria para o mundo. Eu acredito nela, por isso procuro esquecer o que as pessoas falam e lembro que sou muito especial.” (PEREIRA, 2008, p. 44)


Reconhecer a fragilidade e tornar-se menos orgulhoso e dominador é um desafio para a sociedade do século XXI. É necessário mudar para não mergulharmos de vez no caos. É preciso saber cuidar, cultivar a tolerância e aceitar as diferenças e por fim aceitar as pessoas como elas são.