Advogado Anderson dos Santos Domingues já recebeu sentenças que o vincularam à facção paulista; OUTRO LADO: procurado, ele não quis se manifestar.
Tulio Kruse
23.jul.2025
São Paulo - O advogado Anderson dos Santos Domingues, 44, foi alvo de dois pedidos de prisão no último ano e meio. No primeiro, sob a acusação de repassar ordens do traficante internacional Gilberto Aparecido dos Santos, o Fuminho, a companheiros do PCC (Primeiro Comando da Capital). No segundo pedido, feito há cerca de um mês, sob a acusação de integrar um esquema de corrupção de policiais civis em São Paulo.O advogado Anderson dos Santos Domingues, 44, foi alvo de dois pedidos de prisão no último ano e meio -Arte/Metrópoles
Ele já foi condenado duas vezes e cumpriu pena por suas conexões com a facção criminosa paulista. Nos casos mais recentes, escapou da medida cautelar mais grave: os dois últimos pedidos de prisão preventiva contra ele foram recusados pela Justiça.
Domingues, vulgo Doutor, chegou a ficar preso cerca de um ano em regime fechado. Saiu da cadeia sem passar pelo semiaberto —quando o preso pode sair durante o dia e dorme numa unidade penitenciária— pois havia cumprido mais de um terço da pena e apresentava bom comportamento. Em 2017, foi beneficiado por um indulto natalino assinado pelo então presidente Michel Temer (MDB) que anulou parte da pena de sua primeira condenação.
Seis anos depois teve aprovada uma reabilitação criminal, recurso que garante o sigilo da sentença e a suspensão de alguns efeitos da condenação, como a perda de cargo ou função. Nessa época, já havia sido condenado novamente em primeira instância pelo crime de organização criminosa.
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O advogado Anderson dos Santos Domingues, condenado por organização criminosa e alvo de operações por envolvimento com o PCC - Anderson Domingues no Instagram |
O inquérito teve início em setembro do ano anterior, quando um agente da PF foi morto durante uma operação para interceptar um carregamento de drogas no município de Bocaina, a 70 km de Bauru.
Matéria jornalística da época
Equipes policiais aguardavam escondidas pelo pouso de um pequeno avião com drogas numa pista na área rural, normalmente usada por aeronaves agrícolas. Criminosos que estavam em um carro na pista, para receber o carregamento, fugiram quando ouviram as sirenes e atiraram contra uma viatura. O agente Fábio Ricardo Paiva Luciano morreu após ser atingido no tórax por um tiro de fuzil.Cinco pessoas acabaram presas na noite da operação, entre elas o piloto da aeronave —que chegou a levantar voo novamente, mas caiu num canavial próximo à pista de pouso e pegou fogo. Outros suspeitos foram detidos num carro interceptado pela polícia.
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O agente da Polícia FederalFábio Ricardo Paiva Luciano morreu após ser atingido no tórax por um tiro de fuzil - Imagem: Monize Poiani/TV TEM/Arquivo e Arquivo pessoal |
"Observou-se durante as investigações que [o advogado] também tinha sua partilha nas remessas de drogas que vinham do Paraguai. Ele, inclusive, teve diálogos interceptados em que tratavam dessas negociações", diz um trecho do inquérito, transcrito na sentença que o condenou.
Em juízo, Domingues afirmou que emprestava seu celular a clientes e que não sabia que as mensagens tratavam de tráfico de drogas, pois elas eram apagadas em seguida. A Justiça considerou que havia prova de sua participação na maioria dos diálogos. Ele foi condenado a sete anos e quatro meses de prisão.
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Organograma do PCC - Arte/ Metrópoles |
A denúncia do Ministério Público Federal, à época, o acusou de ser "integrante da ‘Sintonia dos Gravatas’", setor do PCC que, além de defender integrantes da facção, envolvia-se "diretamente nas negociações de compra e venda de drogas da facção, tendo ainda destaque na intermediação de conflitos internos do grupo". Em 2019, foi condenado a cinco anos e três meses de prisão.
Depois, o advogado tornou-se alvo da Operação Mafiusi, que desmontou um esquema de tráfico de drogas entre a América do Sul e a Europa.
Domingues foi incluído num grupo de mensagens do aplicativo SkyECC logo após a prisão de Fuminho em Moçambique, na costa oriental da África, em 2020. O fato de já ter sido advogado de pessoas conhecidas do grupo —o chefe do PCC André de Oliveira Macedo, o André do Rap, e dos italianos Patrick e Nicola Assisi, da máfia 'Ndranghetta— teria servido como credencial de confiabilidade.
Segundo a investigação, com a intermediação do advogado e a ajuda de um cônsul honorário de Moçambique no Brasil, o grupo conseguiu que um celular fosse levado para a cela ao lado de onde estava preso Fuminho. Ele teria ditado as ordens que foram repassadas com o aparelho.
As mensagens de Fuminho chegaram aos integrantes do grupo por meio de Domingues, com cinco capturas de tela. Após enviá-las, também de acordo com a apuração, o advogado pediu aos comparsas que não ficasse desamparado caso se tornasse alvo de alguma investigação. Relatou que estava preocupado pois o cônsul moçambicano que havia ajudado no contato com Fuminho seria descuidado ao falar ao telefone.
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Investigador Marcelo Marques de Souza, o Bombom, que era ligado a Gritzbach, e elo entre bandidos e “banda podre” da polícia, é investigado também em ligação com o advogado - Imagem: Reprodução |
Na última sexta-feira (18), Domingues tornou-se alvo de uma denúncia criminal pela quarta vez. Promotores do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) do Ministério Público de São Paulo afirmam que ele intermediou um pagamento de propina a policiais civis para que o helicóptero de um cliente seu fosse liberado. A aeronave havia sido apreendida numa operação de combate ao tráfico de drogas.
Esse último inquérito, que resultou na Operação Agusta, teve início após a apreensão do celular do policial Marcelo Marques de Souza, o Bombom, preso em fevereiro sob acusação de integrar o grupo de policiais civis que extorquia dinheiro do empresário e delator Antônio Vinícius Lopes Gritzbach, morto no aeroporto de Guarulhos.
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Relatório da PF mostra mensagens trocadas entre o policial Marcelo Bombom e o advogado Anderson Domingues sobre pagamentos - Reprodução |
É após ser acionado pelo advogado que Bombom, segundo a investigação, toma a iniciativa de procurar outro policial civil que estava responsável pelo caso em que o helicóptero havia sido apreendido. A aeronave, um modelo Agusta AW109 avaliado em R$ 10 milhões, acabou liberado após as tratativas.
Segundo a acusação, Domingues teria recebido parte do dinheiro pago para obter a liberação do helicóptero. Procurada, a defesa do policial afirmou que vai comprovar sua inocência e se manifestará nos autos do processo.
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Policiais são presos por liberar helicóptero ligado ao PCC após pagamento de propina - Imagem: Divulgação – Polícia Federal |
Questionada, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) informou que Domingues responde a um processo no Tribunal de Ética e Disciplina da instituição. Todos os processos desse tipo são sigilosos. "O Órgão apura toda e qualquer infração que chegue a seu conhecimento por intermédio de representação ou diante de fato divulgado em canais de comunicação", informou a seção paulista da Ordem, em nota.
Fonte: Jornal Folha de São Paulo
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