09 dezembro 2018

MATÉRIA DE DOMINGO : Editorial, Folha de S. Paulo : Moro contra o crime

Futuro ministro mobiliza meios em que o governo pode ser eficaz contra os cartéis da delinquência.








Boca Maldita
9 de dezembro de 2018

Até agora pouco se ouviu falar, entretanto, dos planos do ministro Sergio Moro para os presídios brasileiros,
os grandes celeiros de violentas organizações criminosas atuantes no Brasil





Combater o crime organizado, associado ao tráfico de drogas, tornou-se um dos pontos de foco anunciados pelo futuro ministro da Justiça, Sergio Moro. Os meios escolhidos pelo ex-juiz para a empreitada reconhecem tanto as limitações quanto as vantagens do governo federal nessa área.

A segurança pública, como se sabe, é atribuição constitucional sobretudo dos estados, aos quais estão subordinados os maiores contingentes policiais. À União competem tarefas complementares, como a de atuar em crimes transfronteiriços e a de coordenação.

Como o sistema de pagamentos está estruturado em nível nacional, a vigilância sobre movimentações atípicas —importante para a investigação das organizações criminosas mais salientes— requer uma entidade federal eficaz.

Esta, de preferência, deve estar diretamente conectada às autoridades incumbidas do combate aos cartéis da delinquência.

A transferência do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do ministério da Fazenda para o da Justiça atende a essa recomendação. A ênfase na cooperação e na troca de informações com governos estrangeiros segue preocupação análoga, pois atividades como o tráfico de drogas estão largamente internacionalizadas.

Alvejar as conexões entre a criminalidade organizada e o aparelho do Estado, diretriz expressa pelo futuro secretário nacional de Segurança Pública, o general da reserva Guilherme Theophilo, também integra o rol de condutas nas quais agentes federais podem produzir maior impacto que os estaduais.

Da mesma forma, a prometida melhora, por meio de inteligência e tecnologia, do controle das fronteiras, uma competência da União, elevaria os custos incorridos por traficantes e contrabandistas.

Até agora pouco se ouviu falar, entretanto, dos planos do ministro Sergio Moro para os presídios brasileiros, os grandes celeiros de violentas organizações criminosas atuantes no Brasil.

Gravar o que reclusos e seus advogados conversam, além de levantar sérias dúvidas sobre ofensas a direitos fundamentais, nem de longe será uma solução.

Há quase 700 mil presos no Brasil, segundo o Conselho Nacional de Justiça. Um quarto dos crimes imputados a essa população corresponde a tráfico de drogas. Outro quarto, a roubo. Quase 300 mil não têm condenação. São privados de liberdade por decisões provisórias.

Nesse aspecto, a ideologia punitivista do futuro governo, à qual Moro parece aderir, apenas agravará o quadro. Recusar-se à adoção de medidas de óbvia racionalidade, como desencarcerar pequenos traficantes ou indultar presos de baixa periculosidade, empurrará batalhões de novos recrutas para as fileiras do crime organizado.




Fonte : link editorial https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2018/12/moro-contra-o-crime.shtml