Ministério da Economia diz que solicitação tramita, mas não há previsão; contingenciamento da verba é proibida por lei.
Renata Mariz
14/09/2019 - 12:01
O Ministério da Justiça disse que a questão ainda está sendo analisada Foto: Jorge William / Agência O Globo |
BRASÍLIA — Mais de meio bilhão de reais do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) estão bloqueados para uso. A verba é destinada aos estados para aplicação na área carcerária, com reformas e construção de presídios, compra de equipamentos, programas de modernização, entre outros investimentos. O Ministério da Justiça, que gere os recursos por meio do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), já pediu a liberação de R$ 563 milhões. O Ministério da Economia confirma que o pedido está tramitando, mas "ainda sem previsão" de autorização.
Os recursos do Funpen não podem ser contingenciados, segundo prevê expressamente uma lei de 2017. Antes disso, em 2015, o Supremo Tribunal Federal deu uma decisão na mesma direção: ordenou que o governo federal desbloqueasse todo o recurso que havia no fundo, que chegara a contabilizar mais de R$ 2 bilhões, e se abstivesse de voltar a contingenciá-lo.
O governo, porém, afirma que o bloqueio atual não caracteriza um "contingenciamento", visto que se trata de arrecadação de exercícios anteriores, e não da dotação aprovada na lei orçamentária. No entanto, o próprio Ministério da Economia informa que, para cumprir a decisão do Supremo Tribunal Federal, a pasta de Sergio Moro já enviou a solicitação de acréscimo da dotação do atual exercício - caso em que fica permitido o uso do recurso.
Regras orçamentárias à parte, o fato é que o Depen, ligado ao ministro Moro, espera poder ter o recurso do Funpen acessível, seguindo o propósito da lei e da decisão do Supremo de vedar retenções da verba. Mesmo que o dinheiro não seja integralmente gasto neste exercício, devido a eventual ausência de projetos e outras questões de ordem burocrática, o valor que estiver acessível poderá ser contabilizado para um repasse automático especial, de 25% do total disponível em 2019, previsto na legislação.
O dinheiro do Funpen tem que ser gasto necessariamente com o Sistema Penitenciário |
Há um entendimento na área técnica do Depen que esse percentual de 25% incide sobre o total de recursos disponíveis. Dessa forma, a intenção é ter o maior volume de verba livre para uso, ainda que não seja totalmente empregada, para garantir repasses automáticos mais volumosos. Se não houver o desbloqueio, o cálculo dos 25% se daria sobre o saldo acessível, hoje da ordem de R$ 250 milhões, segundo cálculos internos do departamento.
O contingenciamento do Funpen foi uma prática recorrente do governo federal, desde que foi criado, em 1994, para fazer superavit fiscal primário. Até que a decisão do STF, de 2015, considerou essa medida ilegal, mandando o governo desbloquear todo o fundo e proibindo novos contingenciamentos. A situação caótica do sistema carcerário no país impulsionou o Supremo a dar a decisão. Na ocasião, o sistema prisional brasileiro foi considerado um "estado de coisas inconstitucional".
A determinação só começou a ser atendida em 2016, durante o governo do ex-presidente Michel Temer, e operacionalizada pelo então ministro da Justiça Alexandre de Moraes, hoje ocupante de uma cadeira no Supremo. No fim do ano, mais de R$ 1 bilhão foram repassados aos estados, como cumprimento da decisão do Supremo.
Meses depois, o Congresso aprovou a medida provisória que disciplinava as transferências do Funpen a partir da nova lógica imposta pelo Supremo. A lei criada elencou os procedimentos dos repasses fundo a fundo, as áreas a serem cobertas com o dinheiro, estabeleceu a vedação do contingenciamento, entre outras questões.
Os estados, para receber a verba, têm que atender a uma série de critérios: como ter fundo penitenciário criado, órgão responsável por sua gestão, planos com os programas a serem implementados com os recursos, existência de conselhos de fiscalização. A lei estabeleceu o repasse obrigatório, independentemente de convênios ou outras parcerias, de 40% do fundo a partir de 2020.
Fonte: O GLOBO